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A Scanner Darkly

A Scanner DarklyVou começar dizendo que A Scanner Darkly é meio bagunçado. Às vezes essa resenha fica também, vai saber. Não que os livros de Philip K. Dick sejam todos bem estruturados, sendo esta uma crítica recorrente que vejo por aí à sua obra. Uma falta de processo de rascunhos e o notado fato de escrever alguns de seus romances em um prazo de duas semanas muitas vezes contribuem para que o resultado saia um tanto quanto truncado, mas jamais senti tal dificuldade como neste romance que termino de ler agora.

Mas pode ser porque a bagunça seja, em partes, intencional, batendo com a tenática do romance, mas que não deixa o livro nem um pouco mais agradável de se ler. Demorei mais ou menos um mês para terminá-lo, lendo o primeiro quarto da história em uma semana, e outros três quartos em outra semana trinta dias depois. Demorou para engatar e para me chamar a atenção, li outros livros no meio-tempo, e foi uma experiência mais arrastada que outros trabalhos do Dick, como Palmer Eldritch Flow my tears, the policeman said. 

Pode ser que tenha algo a ver com a época em que fora escrito, mais para o final de sua vida (1977), haja visto que VALIS não é a leitura mais fluida de todas, e The Divine Invasion foi criticado por também parecer mais um rascunho, segundo uns, do que uma obra inteiramente acabada. Apesar de pecar em sua estrutura e forma, entretanto, A Scanner Darkly possui temas bem fortes e uma abordagem algo ambígua sobre um assunto polêmico: o mundo do abuso de drogas.

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The Julian Chapter

The Julian ChapterNão faz tanto tempo assim que li Extraordinário. Foi inclusive um dos primeiros sobre um dos quais escrevi após a fundação desse cantinho de internet. Gostei muito do livro, que foi uma agradável surpresa quando eu não botava tanta fé. Qual não foi a minha surpresa ao descobrir que a autora planejava acrescentar um pouquinho mais à história?

Percebo uma recente tendência em alguns segmentos da literatura de entretenimento, esta de reescrever uma história ou um pedaço dela do ponto de vista de algum outro personagem. É sempre interessante observar a perspectiva de um coadjuvante, ou mesmo um antagonista, sobre os mesmos acontecimentos. Ajuda a adicionar toda uma camada de desenvolvimento, um joguinho psicológico do que cada personagem dá mais atenção a, e mesmo aprimorar um pouco essa ideia da natureza multifacetada da realidade (whoa). Não digo que esta é uma ideia completamente nova: temos coisas como o The Alexandria Quartet (quatro livros contando a mesma história sob diferentes pontos de vista), dos anos 1950; ou mesmo Ender’s Shadow, que é esse giro de perspectiva de Ender’s Game escrito no começo do século. Mas percebo isso recentemente acontecendo com mais frequência, tipo nos livrinhos da Colleen Hoover ou, quem sabe, naquela versão abandonada do quinto livro de Crepúsculo. (mais…)

God Emperor of Dune

1437283Maio começou com leituras pesadas e ainda estou em dúvida se isso foi uma escolha boa ou ruim. Depois de terminar Divine Invasions, queria descansar um pouco do Philip e começar a redigir aquele meu trabalho (para o qual eu comecei lendo VALIS e acabei não lendo nada menos que quatro livros do autor no mês passado). Então resolvi pegar nada tão curto quanto os últimos romances pelos quais eu me aventurei, e estou lendo agora The Two Towers (o volume 2 do Senhor dos Anéis, As duas torres e que, quem sabe, terá um post aqui uns dias para frente). Como tento me manter sempre lendo um livro físico e outro digital, o e-book para compensar o Tolkien não foi nada menos denso: acabei lendo o quarto livro da série Duna. 

Arrisco dizer que God Emperor of Dune, que saiu no Brasil há umas décadas como Imperador Deus de Duna, é o livro mais pesado da série depois do primeiro. O Duna original, um amor de épico, tinha lá suas seiscentas páginas, mas os seus dois volumes seguintes formavam apenas a metade deste tamanho, cada um. Este quarto volta a crescer em extensão: demorei quase duas semanas para passar por todo o romance, mas saí inteiro.

E, atenção, pois aqui tem spoilers de todos os quatro livros da série, já que não tem muito bem como situar este sem falar de seus antecessores e seus desfechos. (mais…)

The Divine Invasion

10846065Segundo volume da “trilogia VALIS” de Philip K. Dick, The Divine Invasion (literalmente, “A invasão divina”) é, digamos, bem mais deglutível que o seu predecessor. A trilogia é composta do homônimo VALIS, deste livro que tratamos aqui, e a sua “continuação” The transmigration of Timothy Archer, que deve aparecer por aqui também muito em breve. O fato de formarem uma trilogia, assim nomeada por Dick, não quer dizer que sejam os três livros intrinsecamente ligados. Na realidade, não dividem sequer um personagem ou ambientação. A ligação é puramente temática: gnosis, conhecimento, teofania, a intromissão dos seres divinos sobre as relações humanas, a realidade como construção e simulacro, e todos os temas ligados à mitologia e teologia judaica, cristã, islâmica, e gnóstica.

The Divine Invasion é mais assimilável que seu predecessor no sentido que é menos um tratado teológico, com trechos da Exegesis e vômito de conhecimento mesclado à ficção que Dick nos apresentou, e mais uma história com enredo e personagens próprios. É mais padrão em ser um romance bem delineado, com suas fronteiras com a autobiografia mais definidas. Não obstante, não deixa de ser uma obra em certos pontos autobiográfica, com os temas recorrentes de VALIS que advêm da vida de Dick também encontrando espaço em suas páginas. E mais, as suas ideias e conhecimentos também transbordam aqui. Li que, na escrita de The Divine Invasion, PKD ficou um ano refletindo (após a publicação de VALIS) e escreveu o livro em si em questão de duas ou três semanas. Isso é, digamos, bem rápido. (mais…)

Neon Azul

NEON_AZUL_1278067736PNão conheço muito de fantasia brasileira. A princípio, meu contato com obras nacionais de ficção especulativa e fantasia no geral se deu apenas com as mais populares, que não me apeteceram. Mas eu tenho interesse em conhecer uma outra abordagem do gênero, e, procurando em outro ramo de fantasia (a urbana), resolvi ir com Eric Novello e seu Neon Azul.

Minhas expectativas foram superadas. Já esperava, por certo contato com o autor, algo diferente do que eu estava acostumado a ler no cenário brasileiro, e o encontrei: uma obra menos derivativa e algo não apenas mais interessante, mas também bastante característico. A voz da narrativa é apropriada para o estilo urbano & dark (ou, talvez, de maneira mais específicica: noir) que é a ambientação pretendida. Ao mesmo tempo, é uma narrativa sombria, mas também ligeiramente bem humorada, com um passo rápido, que remete ao ambiente metropolitano no qual a história se ambienta. Se as histórias tem o seu estilo apropriado, Eric Novello conseguiu encaixar perfeitamente sua temática ao seu estilo. (mais…)